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quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

ENEM-SISU, outra boa ideia estragada

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Desde menino que ouço que os vestibulares precisavam passar por uma remodelação ou simplesmente serem extintos, que uma prova não podia ser tomada como atestado de competência de uma pessoa e tantas outras sentenças de morte desse sistema de seleção.

Fiquei velho vendo mudanças ocorrerem. Cada área de conhecimento e em algumas universidades cada curso tinha sua própria avaliação, depois os vestibulares foram unificados, prevalecendo peso maior para a disciplina base de cada curso (matemática e física para as ciências exatas, química e biologia para as biológicas e assim por diante), redação era eliminatória, redação deixa de ser eliminatória, cada universidade procurando sua fórmula de acordo com a realidade regional.

Com o número de candidatos crescendo a cada ano e o número de vagas mantendo-se constante ou aumentando insignificantemente comparativamente ao número de aspirantes, os vestibulares tornavam-se batalhas duríssimas. Cada vez mais cedo os estudantes eram obrigados a definirem o que fariam pelo resto da vida e este era e ainda é um dos fatores determinantes para o abandono ou troca de curso. Mas aí é outra história que mereceria uma análise mais profunda.

Dada à crescente razão candidatos/vagas, lá pelos anos 60 do século passado, surgiram os cursinhos que promoveram diversos enriquecimentos Brasil a dentro. Com a reforma educacional dos anos 60 a qualidade da educação pública deu início à sua depreciação, o que ainda vem ocorrendo. Governo após governo, os mandatários, gradativamente, passaram a culpar as escolas particulares pela exclusão de pobres das universidades federais, ao invés de assumirem a culpa da baixa produtividade de suas escolas, fosse por causa da baixa remuneração dos professores, pelo desaparelhamento das unidades escolares, pela pouca qualidade dos livros didáticos adotados ou pela falta de livros paradidáticos, ou pela somatória disso tudo e mais alguns fatores. O fato é que a educação pública foi, repetidamente, entregue a incompetentes políticos das relações político-partidárias-íntimas- fisiológicas dos mandatários de plantão.

Chegamos ao ENEM!

Reitores de universidades federais passaram a receber pressão do Ministério da Educação: os adotam o ENEM como processo seletivo, acabando com os vestibulares, ou sua escola teria redução de verbas. Isto me foi confidenciado pelo reitor de uma universidade federal, amigo pessoal. Para corroborar minha certeza que este reitor não mentia, poucos dias depois prepostos do MEC falam à imprensa que esta pressão não existia e quando alguém de um governo petista nega é porque existiu. É um governo pelo avesso.

Não seria um retrocesso, muito pelo contrário, seria um grande avanço se a dobradinha ENEM-SISU fosse levada a sério. Um dos maiores benefícios é não ter datas de vestibulares chocando, como passou a ocorrer nos últimos anos e que era evitado pelas Comissões Permanentes de Vestibular das universidades federais. Era comum jovens prestarem três ou quatro vestibulares e para isso se deslocarem entre cidades e estados. Com as datas não coincidindo, essa árdua tarefa era possível de ser realizada, mas era cansativa e dispendiosa, mais um motivo para o afastamento dos jovens. ENEM e SISU acabaram com isso, ótimo. Mas os defeitos também apareceram e se multiplicaram.

O conhecimento científico está sendo cada vez mais ignorado, dando espaço à ideologização dos conteúdos e a exigência pífia de conhecimentos científicos. Algumas questões de matemática da última edição do ENEM chegam a ser vergonhosas, resolvíveis por qualquer estudante mediano do oitavo ou nono ano do ensino fundamental, e qual o interesse dessa queda de exigência? Para mim a resposta é óbvia: permitir que os estudantes das sucateadas escolas públicas tenham um pouquinho mais de chance de se igualarem na disputa por vagas, mesmo já tendo a imensa vantagem das cotas, uma aberração que discrimina com o discurso de igualar.

Vejamos este exemplo:

O dono de uma oficina mecânica precisa de um pistão das partes de um motor, de 68 mm de diâmetro, para o conserto de um carro. Para conseguir um, esse dono vai até um ferro velho e lá encontra pistões com diâmetros iguais a 68, 21 mm; 68, 102 mm; 68, 001 mm; 68, 02 mm e 68, 012 mm.

Para colocar o pistão no motor que está sendo consertado, o dono da oficina terá que adquirir aquele que tenha o diâmetro mais próximo do que precisa.

Nessa condição, o dono da oficina deverá comprar o pistão de diâmetro:

A) 68, 21 mm

B) 68, 102 mm

C) 68, 001 mm

D) 68, 02 mm

E) 68, 012 mm

Ora, isto é comparação de números racionais, conteúdo do sexto ano, antiga quinta série.

Não bastasse o baixíssimo nível das questões, a mínima exigência de conhecimento científico e a ideologização das questões da área de ciências humanas, ainda há os custos absurdos, a impressão em gráficas particulares mesmo estando o parque gráfico das universidades ocioso com o fim dos vestibulares em muitas delas e a desonestidade, principalmente na correção das redações, como vem sendo mostrado timidamente por alguns órgãos da imprensa, como esta reportagem do jornal O Globo, na qual um avaliador diz que os avaliadores recebem pressão para darem nota 900 ou 1.000 para redações que mereciam 600. Com certeza essas redações supervalorizadas não são de “filhos da elite”, mas de alunos mal preparados por escolas públicas.

 

©Marcos Pontes

2 comentários:

  1. Excelente texto, meu amigo! Um texto muito bem escrito, conciso e louvável. Sobre o Enem, com certeza ele seria uma ótima ideia, se não fosse a cúpula do PT que estivesse em sua organização. A ideia do Enem resolveria muitos problemas que sempre ocorrem, em se tratando de realização de vestibulares, e DEVERIA ser um método igualitário, JUSTO e CONFIÁVEL. Todavia, como temos um governo do avesso, as coisas acontecem exatamente ao contrário do que deveriam ser. Com isso, temos um vestibular "enigmático", pois não se sabe como são dadas as notas, injusto e defasado. Infelizmente esses são apenas alguns dos melhores atributos do Enem. Prestei o Enem ano passado, mas não entrei na Ufam por esse sistema... Pois fiquei "travado" na sua grande burocracia, mesmo tirando notas boas. Enfim, a ideia é muito boa, mas o governo PTetista conseguiu destruí-la, buscando benefícios próprios, usando o Enem como elevador político.

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  2. A cada dia me convenço mais que é verdade o que vc diz no texto. Eu sou uma prova viva, sempre estudei em escola pública, por um grande "milagre" consegui passar na prova do ENEM. Estou iniciando um curso superior, e já estou sentindo na pele a grande diferença de "bagagem" de quem está ali por merecimento, e de quem está ali por sorte. Não tenho a mínima ideia de como reverter isso, o tempo não volta. Tento me superar me esforçando, mas a diferença é grande. triste.

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